DIAS FRIOS.

 

A VONTADE DE NÃO TER VONTADE.

Há dias em que tudo amanhece chuvoso  no coração, uma preguiça sem tamanho toma conta da gente e uma nostalgia chata  e lerda nos invade. Uma des-vontade; o dia amanheceu, mas dentro ainda é madrugada, hora do melhor sono.

Tudo é tão cinza e cheio de silêncio, e se um som irrompe o vácuo criado pela quietude, parece que vem como um insulto indizível, algo pior que ofender a mãe ou coisa do tipo.

Agente procura, meio desconfiado, a razão desta sensação de não sensação, vasculha a alma e procura fatos recentes e um pouco mais longínquos, contudo, nada nos responde o porquê da gelatina existencial ter entrado garganta abaixo e invadido todo nosso ser.

Parece que calaram DEUS, parece que tudo é assim mesmo, que nada pode ser nem melhor e nem pior, tudo nasceu pra brincar, eternamente, de estátua, uma espécie de conspiração cósmica a favor da inércia.

Dias em que fazemos o funeral do bichinho que cuidamos com amor, que levamos flores à lápide de amados mortos, que visitamos os ausentes e desejamos com todo ardor, vender tudo, largar tudo, trocar o mundo por uma mochila e uma barraca, fazendo as feitas de ermitão, enquanto a infecção cardíaca não se cura, e , enterramos fundo no coração aquela dorzinha que promete ser a semente de uma grande saudade.

A oração parece leitura de cardápio, a introspecção parece ser visita a um país glacial, tudo branco e silencioso, frio e sem qualquer esperança de mudança.

Onde está o amor ? Onde estão as coisas em que sempre cri ?

Sepultaram a justiça e mataram o perdão.

Quem poderá nos salvar desse tobogã sem fim ?

Oque resta nesses dias é se abrigar nas estruturas já feitas.

Se apegar ao que já foi conquistado e se proteger do frio;  esperar que as cores, sons e sabores voltem do ciclo migratório que lhes é próprio.

Não adianta correr pra longe da dor, ela corre tanto quanto se pode correr. Não adianta se esconder de você mesmo, antes, é hora de se aninhar sob o teto da racionalidade e se acalentar junto ao fogo da lembrança das coisas que podem dar esperança.

É hora de se sentar quietinho e não esperar pelo sentimento da presença de DEUS, nesses dias assim, ele quase não costuma deixar-se ser notado. Ele está lá, mas, está fazendo fisioterapia na alma nossa, nos forçando a mexer membros que foram machucados, forçando músculos que não se moviam fazia muito tempo. Dói.

A solidão é remédio amargo pra quem está condicionado aos sentimentos e as sensitividades da vida.

Acalme-se, sente-se , feche os olhos de levinho, respire fundo várias vezes, chore, seque as lágrimas, respire fundo mais algumas vezes, faça uma prece, do tamanho e do conteúdo que quiser, diga ao final dela: EM NOME DE JESUS, SEJA FEITA TUA VONTADE.

E espere que sol saia, mais uma vez, na sua vida.

Não há neblina tão densa que a luz não possa atravessar, não há noite tão rebelde que não se subjugue ao dia.

Saiba que tudo conspira ao seu favor e não por seu favor.

Dias assim, em que agente não quer, nos resta o crer.